“80 em 15” debate os caminhos e o futuro da Justiça do Trabalho
“O passado não tem volta, mas é alicerce do presente e aprendizado para o futuro”. Assim afirmou a presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, desembargadora Ana Amarylis Vivacqua de Oliveira Gulla, em sua saudação gravada em vídeo, na abertura da segunda edição do Seminário “Justiça do Trabalho, 80 em 15”, evento promovido pela Vice-Presidência Judicial em parceria com a Escola Judicial do TRT-15. O encontro híbrido foi realizado no auditório da escola, e teve transmissão ao vivo pelo canal do Youtube. O evento contou com participação presencial de desembargadores, como o presidente eleito Samuel Hugo Lima e Fábio Bueno de Aguiar, e juízes Guilherme Guimarães Feliciano, auxiliar da Vice-Presidência Judicial, e Adriano Costa, do TRT-5 (BA), representando no ato a presidente daquele tribunal, desembargadora Débora Machado.
A presidente Ana Amarylis resgatou o histórico da criação do TRT-15 em Campinas, em meados da década de 1980, período de grande instabilidade monetária, altos índices inflacionários, greves sucessivas, aumento das demandas trabalhistas, adoção de planos na tentativa de retomar o crescimento socioeconômico, mas também marcado por uma “efervescência dos ideais democráticos”. Nesse cenário, a instalação de um segundo tribunal trabalhista no interior do estado de São de Paulo marca o esforço de lideranças como o presidente desembargador do TRT-2 (SP), Pedro Benjamin Vieira, grande articulador do desmembramento da Justiça do Trabalho com o objetivo de melhor atender os cidadãos, mas também do então ministro do Trabalho Almir Pazziantto Pinto, o juiz Adilson Bassalho Pereira e o deputado federal Francisco Amaral. A homenagem desse evento, lembrou a presidente, também faz jus ao jurista Wagner Giglio e ao ministro Milton de Moura França.
Assinada em 14 de julho de 1986, a Lei 7.520, responsável pela criação do novo tribunal, só se materializou no dia 5 de dezembro do mesmo ano, com a instalação da corte, composta por 23 magistrados de segundo grau e 38 Juntas de Conciliação e Julgamento. O TRT-15 porém, “agigantou-se”, ressaltou a presidente, e “são muitas as nossas conquistas nesses 36 anos” que nos transformaram num dos mais “produtivos do país, com geração de jurisprudência firme e inovadora” e “sinônimo de justiça, produtividade e modernidade”, mas que guarda, como sua “maior riqueza, o coração das pessoas que aqui trabalham”, concluiu a magistrada.
O vice-presidente judicial da Corte, desembargador Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani, compôs a mesa de abertura dos trabalhos ao lado do ministro aposentado do Tribunal Superior do Trabalho, Carlos Alberto Reis de Paula, e do diretor da Escola Judicial, desembargador João Batista Martins César. Em sua saudação, o desembargador Giordani destacou a “grande honra” proporcionada pela presença do ministro Reis de Paula no TRT-15, segundo ele “um poço de atenção e gentileza”. O magistrado afirmou também que no dia 5 de dezembro, mesma data do evento, comemora-se o Dia do Solo. Numa associação livre, o desembargador comparou a “fragilidade das flores de um jardim” à “fragilidade da vida humana, especialmente a vida dos trabalhadores”, e lembrou que assim como os jardineiros, que “protegem e cuidam de suas flores de serem pisoteadas e arrancadas”, os operadores do direito têm obrigação, da mesma forma, de proteger os direitos dos trabalhadores e de suas famílias para que floresçam. “Essa é missão da Justiça do Trabalho”, concluiu.
O diretor da Ejud, desembargador João Batista Martins César, ressaltou a importância do evento que destaca o relevante papel do TRT-15 no cenário nacional como referência de inovação, desenvolvido em parceria com o Ministério Público do Trabalho (MPT-15), órgão do qual foi integrante por 14 anos. O magistrado citou, por exemplo, dois casos em que o Tribunal da 15ª, receptivo às teses do MPT, contribuiu com seus julgamentos para a criação de leis de proteção de pessoas com deficiência e de jovens aprendizes, e que obrigam o cumprimento de cotas por parte das empresas.
O magistrado falou ainda que, ao revisitar a história, é possível ver que a aprendizagem, como garantia de inclusão de jovens carentes, foi preocupação nosso primeiro presidente negro do país Nilo Peçanha (1909-1910), criador das primeiras escolas de aprendizagem para os “deserdados da fortuna”, como afirmava, e considerado o patrono da educação profissional e tecnológica no Brasil. Nesse sentido, o desembargador João Batista defendeu a necessidade de políticas públicas eficazes para o acesso de jovens aprendizes ao trabalho, sem perder de vista a manutenção dos seus direitos fundamentais.
Conferência Magna: passado, presente e futuro da Justiça do Trabalho
O ministro aposentado do TST Carlos Alberto Reis de Paula abriu oficialmente o evento com sua conferência sobre o passado, o presente e o futuro da Justiça do Trabalho. Traçados em linhas gerais sobre a história, os caminhos trilhados pela JT no Brasil foram expostos pelo ministro, que relacionou os principais passos desse ramo do direito com o arcabouço de avanços e retrocessos de direitos. Se é verdade que o direito do trabalho está “umbilicalmente ligado à Revolução Industrial”, conforme afirmou o magistrado, no Brasil, país essencialmente agrícola até meados do século XX, ele foi se conformando a partir de 1922, com a criação no estado de São Paulo dos primeiros tribunais rurais, depois com a estruturação sindical e a aprovação da Consolidação das Leis do Trabalho em 1943.
Iluminada pelos princípios estampados na encíclica Rerum Novarum, que lançou segundo o ministro Reis de Paula “um olhar de humanidade” sobre a exploração do trabalho, a nem sempre pacífica relação entre capital e trabalho no Brasil registrou inicialmente a conquista de direitos para os trabalhadores urbanos e foi se estruturando num movimento de avanços e retrocessos, até abarcar também outras classes, como as dos rurais, na década de 1960, e a promulgação da Constituição de 1988 elencou os principais direitos trabalhistas e desenhou a atual conformação de 24 tribunais em todo o país.
Já mais recentemente, sobre a reforma trabalhista de 2017, o ministro Reis de Paula destacou algumas das principais mudanças sofridas na legislação e o abalo em alguns princípios fundamentais até então praticados, como o da subordinação, que desde a década de 1980, com o avanço das atividades autônomas, já vinha alterando as relações de trabalho. A principal mudança de paradigma, no entanto, a prevalência do negociado sobre o legislado, paralelamente ao surgimento e crescimento de novas modalidades de trabalho, permeadas pelo intenso uso de tecnologia, é tema ainda que desperta e desafia a atenção dos operadores do direito nos dias atuais. O ministro ressaltou, porém, que independentemente das alterações e inovações na moderna Justiça do Trabalho, “o princípio da proteção sempre será o maior quando da contratação do trabalho humano”, e afirmou que “o caminho de toda sociedade é a busca do ponto de equilíbrio entre o capital e o trabalho, com a manutenção dos direitos fundamentais do trabalhador, bem como do ambiente do trabalho e o combate da escravidão contemporânea”.
Após a conferência, seguiram-se os painéis. O primeiro, com a temática “Grandes Casos: Eli Lilly/ABL”, com mesa coordenada pelo desembargador aposentado José Antonio Pancotti, contou com exposição e debate dos desembargadores Fabio Alegretti Cooper e Fábio Bueno de Aguiar.
O segundo painel, sob o tema “Grandes Casos: Odebrecht”, teve o desembargador Hélio Grasselli como presidente da mesa. O desembargador Edison dos Santos Pelegrini e o juiz do trabalho aposentado Tárcio José Vidotti conduziram a temática como expositor e debatedor, respectivamente.
No terceiro painel, o tema “Grandes Vultos: Pedro Benjamin Vieira (vida e obra)”, a presidência ficou a cargo do desembargador Renato Henry Sant’Anna, e contou com os procuradores regionais do trabalho Fábio Messias Vieira, como expositor, e Nei Messias Vieira, como debatedor.
O quarto painel tratou “Grandes Vultos: Wagner Giglio (vida e obra)”, e teve como presidente a desembargadora aposentada Eliana Felippe Toledo. Como expositor, falou o desembargador Orlando Amâncio Taveira, e como debatedora, a juíza aposentada Cláudia Giglio Veltri Correa.
O último painel, “Grandes Vultos: Milton de Moura França (vida e obra)”, teve como presidente o desembargador Manoel Carlos Toledo Filho. O ministro aposentado do TST Antonio José de Barros Levenhagen foi o expositor do tema, que teve como debatedor o vice-presidente judicial do TRT-15, desembargador Francisco Giordani, que também conduziu o encerramento do encontro.
Livro Diversidade
Durante o seminário foi distribuído o livro Diversidade: direitos humanos para todas as pessoas, uma iniciativa do Grupo de Estudos da Diversidade, instituído pela Escola Judicial do TRT-15, que realiza a diversidade de várias formas. Os principais eixos são racismo e branquitude; gênero e sexualidade; capacitismo, deficiência e inclusão. Sobre estes e outros temas de direitos humanos, recebemos artigos de estudantes, docentes, advogadas e advogados, magistradas e magistrados de todas as regiões do Brasil. Foram abordadas questões relacionadas ao papel do direito e do Estado, à educação inclusiva, à migração, à comunicação social, ao trabalho, à violência, ao assédio e às discriminações. Em síntese, é a diversidade em ação para a construção de uma sociedade livre, justa, solidária e plural.
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