Conferência sobre a era digital encerra 22º Congresso Nacional de Direito do Trabalho do TRT-15

Conferência sobre a era digital encerra 22º Congresso Nacional de Direito do Trabalho do TRT-15
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Com apresentação do diretor da Escola Judicial do TRT da 15ª Região, desembargador João Batista Martins César, a conferência sobre solidariedade na era digital, proferida pelo ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Alexandre Luiz Ramos, encerrou, na sexta-feira, dia 19/8, a 22ª Edição  do Congresso Nacional de Direito do Trabalho e Processual do Trabalho, realizada no Expo Dom Pedro em Campinas. Durante dois dias, mais de 750 pessoas participaram do evento, nos formatos presencial e telepresencial.

Para adentrar no tema, que classificou como extremamente complexo, o ministro Alexandre Ramos estabeleceu algumas premissas com base em reflexões próprias.  Em sua análise, o direito do trabalho perpassa pelo disciplinamento da Consolidação das Leis do Trabalho, formatada na ditadura Vargas, que tem um foco muito restrito diante do universo de trabalhadores existentes no Brasil. “A CLT se aplica basicamente ao trabalhador urbano, da indústria, do comércio e do sistema financeiro. É preciso entender o direito do trabalho em um sentido mais amplo, abrangendo várias outras formas de trabalho, inclusive o trabalho não subordinado”, asseverou.  

Na visão do palestrante, a jurisdição trabalhista deve se basear nos princípios constitucionais de valorização do trabalho humano, da dignidade da pessoa humana e na construção de uma sociedade livre, justa e solidária. O ministro Alexandre Ramos enfatizou que para isso, “é necessário uma pertinência  da norma de regência com a situação factual, porque o descompasso acaba gerando incertezas, imprevisibilidade e insegurança”. De acordo com ele, esse ambiente não é adequado para o desenvolvimento da atividade econômica, na qual a força de trabalho se insere. 

O palestrante apontou ainda como premissa a velocidade “supersônica” de evolução da sociedade, que não é acompanhada pela legislação. As demandas, por outro lado, são submetidas instantaneamente ao Poder Judiciário e à Justiça do Trabalho. “Nós precisamos dar respostas, usando ferramental normativo insuficiente para resolver essas questões”. Outro pressuposto assinalado pelo ministro diz respeito ao fator protetivo, um consenso em todas as matrizes do Judiciário. “A questão é o grau de proteção, em que deve haver coerência. Assim como um remédio na dose certa protege, na dose errada, seja inferior ou superior, pode gerar um efeito reverso”, afirmou. Para o ministro, é necessário também dosar o grau de proteção do trabalhador conforme o nível de hipossuficiência.

Alexandre Ramos ressaltou que a tecnologia está permeando e alterando muito rapidamente todos os setores da vida social, incluindo trabalho e consumo, e a pandemia da covid-19 acelerou o processo. “Há desafios que precisam ser enfrentados. É necessário ter uma compreensão mais clara do que é o trabalho por plataforma”, defendeu, ao enumerar os serviços oferecidos pela web e pelos aplicativos de localização e entrega, com base em relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre o impacto das novas tecnologias no mundo empresarial e do trabalho. 

De acordo com o estudo realizado em países desenvolvidos e em desenvolvimento, essas empresas têm como pontos em comum os mecanismos de fixação de preços, remuneração e cobrança de comissões, correspondência de trabalhadores com os clientes, e atribuição e avaliação do trabalho via algoritmos. O ministro destacou outro dado do relatório da OIT que diz respeito às motivações dos trabalhadores para o engajamento nas plataformas digitais. A primeira seria complementação de renda, com 39%; a segunda, preferência ou necessidade de trabalhar em casa ou flexibilidade de horário, com 29%; e, por último motivo, o lazer, com 19%. O relatório indica ainda que os trabalhadores da web estão satisfeitos ou muito satisfeitos com a atividade laboral escolhida.

Alexandre Ramos reforçou a competência do juiz do trabalho no enfrentamento dessas questões, mas, para ele, ainda não há resposta certa sobre reconhecimento ou não de vínculo empregatício entre o trabalhador e as plataformas. “Há muitos fundamentos plausíveis para se defender e sustentar a aplicação da CLT nesta situação.  Mas não vejo que a norma seja adequada para gerar um grau de proteção, garantindo equilíbrio entre empresas de tecnologia de plataforma e trabalhadores”.

O ministro defendeu o diálogo social, mas reconheceu que o sistema sindical brasileiro precisa ser reinventado para garantir representatividade e legitimidade. “Há ainda uma dificuldade muito maior de arranjos coletivos desses trabalhadores por plataforma, que não estão reunidos numa mesma planta física”, complementou.  Segundo Alexandre Ramos,  o poder legislativo tem papel de protagonista na produção de normas adequadas para essas novas situações, considerando o cenário empresarial brasileiro, o perfil do trabalhador e o avanço tecnológico.

Em sua conclusão, o palestrante reforçou a necessidade de “enfrentar esses novos desafios a partir de uma lógica de centralidade do ser humano para garantir que o futuro do trabalho no Brasil seja com perspectiva do trabalho decente”. Defendeu também um dos pilares do desenvolvimento sustentável, a Agenda 2030, por meio da adoção de projetos que afastem a discriminação e a precarização, e reduzam a pobreza e a desigualdade de gênero. De acordo com Alexandre Ramos, esses projetos devem estabelecer graus de proteção adequados para os vulneráveis visando, por meio do trabalho, garantir não só a fonte de sobrevivência, como também desenvolver potencialidades humanas e integração social, que são as três funções principais do trabalho em sociedade. 

Excelência dos debates

Ao declarar encerrado o congresso, o desembargador João Batista Martins César fez um resumo dos principais temas abordados e destacou a excelência dos debates, reforçando que “o algoritmo não pode ser usado como mais um instrumento discriminatório no mundo do trabalho”. A partir da leitura de uma fábula, o diretor da Ejud-15 enfatizou que “só é possível mudar o mundo se mudarmos a cabeça do homem” e que “a academia existe para encontrar soluções para o que está errado”.

Confira aqui outras fotos do 1º dia de Congresso. 

Confira aqui outras fotos do 2º dia de Congresso.

Fotos e vídeos: Douglas Carvalho, Gioceli Carvalho, Hélcio Guerra e Paulo Arantes

Unidade Responsável:
Comunicação Social