Painel aborda faces do escravismo histórico e contemporâneo
Ainda na tarde de quinta-feira (18/8), o 4º painel do 22º Congresso Nacional de Direito do Trabalho e Processual do Trabalho abordou o tema “Trabalho Escravo: ontem, hoje e amanhã”. Membro do Comitê para a Erradicação do Trabalho Escravo Contemporâneo, do Tráfico de Pessoas, da Discriminação de Gênero, Raça, Etnia e Promoção da Igualdade do TRT-15, o juiz do trabalho Marcus Menezes Barberino Mendes presidiu o painel. Ao seu lado, compuseram a mesa o professor da Unicamp e da Universidade Federal do ABC, Marcio Pochmann, e o reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, José Vicente.
Ao dar início aos trabalhos, o magistrado ressaltou a relevância do tema na atualidade, pois os dados mostram que o trabalho escravo contemporâneo lamentavelmente faz parte da realidade brasileira. Para o dirigente da mesa, é fundamental falar sobre o assunto, que considera ser “a base fundante deste Estado Nacional e a parte que falta para superar o fato de não sermos um país democrático desenvolvido”.
Em sua exposição, o professor Marcio Pochamnn abordou a temática “escravizados digitais”, a partir do panorama histórico sobre os fundamentos da condição do trabalho forçado na sociedade brasileira, desde a era escravista até a digital, apontando que a expansão da indústria ocasionou o avanço do trabalho livre assalariado, a representação sindical e a implantação da Justiça do Trabalho.
Segundo o palestrante, a perspectiva de trabalho livre e assalariado sofreu “um grande ataque desde que o Brasil optou por ingressar na globalização de forma passiva e subordinada, sem se preocupar em proteger e criar condições para que o setor produtivo brasileiro pudesse sobreviver com essa nova fase”, o que estancou o assalariamento, regrediu direitos e levou a população a buscar outras formas de sustento, tais como o trabalho informal e a transferência de rendas do orçamento público (auxílios públicos), situação agravada com a pandemia do coronavírus. Esses fatores constituem “a base social pela qual o processo de trabalho forçado ganha magnitude no Brasil”.
O professor finalizou sua apresentação salientando que para enfrentar essa realidade é necessário reconhecer que estamos diante de uma nova era, a digital, de um novo regime climático e, ainda, que o centro dinâmico do mundo (econômico, industrial e tecnológico) se deslocou do ocidente para o oriente. “Reconhecer esses eixos fundantes do novo contexto é parte fundamental para alterar essa fase em que o trabalho forçado ganha dimensões generalizadas, cujo proprietário, o senhor de escravos, é o algoritmo”, concluiu.
O reitor da Universidade Zumbi a Palmares, ao discorrer sobre o “escravismo negro e cotas raciais”, destacou a situação da população negra no Brasil que, explorada e escravizada por centenas de anos, seguiu marginalizada mesmo após a abolição da escravatura, pois o trabalho formal assalariado passou a ser desempenhado majoritariamente pelos imigrantes europeus, “não havendo lugar para o negro na “sociedade regulada”, pontuou.
Na visão do palestrante, apesar das inúmeras mudanças sociais e econômicas ocorridas com a revolução da indústria, a questão do racismo nada mudou, não tendo bastado a inclusão do tema da igualdade na Constituição de 1824, pois jamais se tornou realidade, “seja pela ambiguidade, pela dissimulação, ou pela falta de compromisso verdadeiro com os pressupostos do Estado”. O expositor frisou ainda que, apesar de a República se pautar sobre a democracia e igualdade, os negros seguem excluídos, pela “desonestidade na disposição de tornar possível a igualdade para todos”.
Diante dessa realidade de exclusão, foi necessária a adoção de políticas públicas, com a finalidade de reparar a injustiça social reiterada ao longo dos séculos. O palestrante comemorou a criação do sistema de cotas raciais para ingresso nas universidades, no serviço público e, posteriormente, na iniciativa privada. Destacou que esse sistema tem possibilitado a criação de uma primeira classe intelectual negra, além do acesso do negro a cargos políticos, militares e a empregos qualificados. O expositor finalizou pedindo o apoio de todos para que não haja retrocesso e para “construirmos um país que caibam todos”.
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Fotos e vídeos: Douglas Carvalho, Gioceli Carvalho, Hélcio Guerra e Paulo Arantes.
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