Mutirão nesta semana reforça combate ao trabalho infantil
A Justiça do Trabalho, em parceria com o Ministério Público do Trabalho (MPT), em comemoração ao Dia Mundial Contra o Trabalho Infantil de 2023 (12 de junho), promove nesta semana (29 de maio a 2 de junho) um mutirão de julgamentos de processos relacionados a trabalho infantil e aprendizagem profissional. O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, por meio de seu Comitê de Erradicação do Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem, participa de atividades promovidas principalmente no âmbito de seus dez Juizados Especiais da Infância e Adolescência (Jeias).
Processos emblemáticos no TRT-15
“Infelizmente os processos que envolvem ambos os temas têm sido cada vez mais frequentes”, ressalta a juíza titular da 2ª Vara do Trabalho de Franca e coordenadora do Jeia local, Eliana dos Santos Alves Nogueira. Segundo a magistrada, parte deles são reflexos da pandemia Covid-19 e outra parte vem de “ações de conscientização que, em Franca, são realizadas há quase uma década, com a efetiva participação do Jeia em ações que envolvem todo o sistema de garantia de direitos”. Não por acaso, Franca ocupou a segunda posição entre as cidades com maior número de notificações de trabalho infantil, de acordo com recente pesquisa realizada nos anos 2007 a 2020 pelo MPT.
O Jeia de Franca selecionou três processos emblemáticos que apresentam “gravíssimas violações que vão além da esfera trabalhista, inclusive com danos psíquicos para os adolescentes”, de acordo com a magistrada. O primeiro envolve um adolescente que, assim que completou 16 anos, foi levado para trabalhar em uma fábrica de borracha no município (atividade proibida para pessoas com idade inferior a 18 anos, e relacionada no item 48 da Lista TIP, que tipifica as piores formas de trabalho infantil) e sofreu grave acidente. O trabalho foi desenvolvido sem reconhecimento de vínculo e proteção previdenciária.
Outro caso envolve um adolescente de 15 anos que foi trabalhar em comércio local, sendo colocado para percorrer longas distâncias em bicicleta (em atividade igualmente proibida para quem tem idade inferior a 18 anos, conforme item 73 da Lista TIP). Há relatos de maus-tratos e prática de racismo por parte do empregador. Trata-se de garoto negro que era constantemente humilhado em razão de seu cabelo e com frases do tipo “é preto fazendo pretice”.
E, por fim, o terceiro caso envolve outro adolescente de 15 anos que foi contratado para trabalhar como “barman” em atividade noturna (ferindo item 3 da Lista TIP), sem vínculo formalizado e nem proteção previdenciária. O adolescente narra que foi necessário abandonar a escola para o trabalho que exigia jornada até as 2 horas da manhã, com baixa remuneração.
A fim de ampliar a proteção aos adolescentes e na perspectiva de atuação em rede da Justiça do Trabalho, por seu Juizado Especializado, no primeiro caso narrado, o adolescente já foi atendido pela rede de proteção local (assistente social e psicóloga, a pedido do JEIA). No segundo e terceiro casos, as audiências serão as primeiras em cada processo. Independentemente do resultado preliminar das audiências, os adolescentes serão encaminhados para a Escuta Especializada, cujo órgão foi recém-implantado no município e atuará em parceria com o Jeia para atendimento integral e encaminhamentos necessários, na perspectiva da proteção integral e prioritária.
A juíza Eliana Nogueira ressaltou que “a Justiça do Trabalho precisa, com urgência, configurar-se como sistema de multiportas para ampliação do acesso à justiça, notadamente nas questões de grande impacto social, que apresentam os graves problemas estruturais ainda presentes no nosso país, a exemplo do trabalho infantil, e a criação de juizados especializados em questões que envolvem o trabalho de pessoas com idade inferior a 18 anos representa o modo mais adequado e efetivo para tal finalidade”.
São José dos Campos
O juiz titular da 1ª Vara do Trabalho de Jacareí e coordenador do Jeia de São José dos Campos, Adhemar Prisco da Cunha Neto, também selecionou pelo menos sete casos envolvendo exploração do trabalho infantil, entre eles, o de uma babá que trabalhou dos 16 aos 17 anos, sem registro e realizando horas extras; o de um garoto de 17 anos admitido como balconista e que não tinha folgas aos domingos nem recebia vale transporte, e que pede a rescisão indireta do contrato; o de um recepcionista que trabalhou sem registro entre os 16 e 17 anos e reclama que nunca descansava em domingos e feriados, nem tinha o horário de refeição respeitado; e o de um jovem que foi admitido como barman às vésperas do aniversário de 17 anos, embora tenha sido registrado meses depois.
Há também o processo de uma vendedora contratada com 16 anos sem registro e sem receber o mínimo legal, que reclama pelo trabalho extraordinário até de madrugada, e de ter sido vítima de várias agressões verbais, inclusive de cunho sexual, motivo pelo qual pediu indenização por danos morais. Outro caso envolve um garoto de 15 anos, admitido como garçom e que só foi registrado com 16. Pediu demissão, mas deseja o reconhecimento da rescisão indireta. Reclamou também horas extras e falta de integração de pagamentos feitos “por fora”.
Por fim, um rapaz de 16 anos, afirma que foi contratado sem registro para auxiliar no trato dos animais de uma fazenda. Disse que recebia menos que o mínimo e que realizava horas extras. Reclamou pelo trabalho aos domingos e feriados. Também pediu o pagamento das verbas rescisórias. Nesse último caso, já apto para julgamento, o magistrado afirmou já ter sido feita a defesa e audiência de instrução, em que o empregador disse ser parente do jovem trabalhador, com quem mantinha “uma relação paternal”. Segundo sua defesa, “a jornada declinada não seria factível porque o reclamante frequentava a escola” e por isso negou os pagamentos.
Outras ações de combate ao trabalho infantil no TRT-15
Em Ribeirão Preto, os trabalhos começaram já no dia 17 de maio com o “Faça Bonito”, movimento em homenagem ao Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes (18/5). A campanha é uma ação realizada por meio da parceria entre o Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho, o Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes e a Rede ECPA.
O Jeia local, coordenado pela juíza Marcia Cristina Sampaio Mendes, titular da 5ª VT de Ribeirão Preto, em parceira com o Fórum pela Erradicação do Trabalho Infantil daquele município, promoveram no auditório nobre da Câmara Municipal de Ribeirão Preto o encontro “Tuca e Juba – Prevenção da violência sexual para crianças e adolescentes”, para um público de professores, educadores e estudantes da rede municipal e estadual.
No dia 18, também em Ribeirão Preto, um seminário organizado pelo Comitê de Erradicação do Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da 15ª, com apoio da Escola Judicial da 15ª, e pelo Grupo de Estudos de Direito do Trabalho da FDUSP/RP, pelo Centro Universitário Estácio de Ribeirão Preto e pelo Centro Universitário Barão de Mauá, reuniu juristas e acadêmicos para o debate sobre a aprendizagem como instrumento de transformação socia. O evento contou, em sua abertura, com a participação telepresencial do ministro do Tribunal Superior do Trabalho Evandro Pereira Valadão Lopes. No mesmo dia 18, na Basílica histórica de Aparecida, o juiz Adhemar Prisco da Cunha Neto fez a leitura da “Carta de Aparecida contra o abuso e a exploração sexual comercial infantil”.
- 313 visualizações