5ª Câmara condena empresas a pagarem R$100 mil à mãe de um menino de 16 anos morto em serviço

5ª Câmara condena empresas a pagarem R$100 mil à mãe de um menino de 16 anos morto em serviço
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A 5ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região manteve a condenação de duas empresas, uma individual e outra, a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo – (Ceagesp), condenada de forma solidária, no valor de R$ 100 mil, a título de indenização por danos morais, a ser paga à mãe de um garoto de 16 anos morto em acidente de moto, enquanto trabalhava na entrega de caixas de madeira para a Ceagesp. 

Em sua defesa, as duas empresas pediram, entre outros, a reforma da sentença do Juizado Especial da Infância e Adolescência (Jeia) de Sorocaba quanto ao reconhecimento de vínculo empregatício, o afastamento da responsabilidade solidária e a redução do valor arbitrado para a indenização por danos morais, além da reversão da condenação ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais.

O que se comprovou pela narrativa dos autos foi que um menino de apenas 13 anos tinha sido contratado por uma empresa individual de fabricação de caixas de madeira, para trabalhar na função de ajudante geral, com salário de R$ 50 por dia. O contrato se estendeu de primeiro de outubro de 2013 a 10 de outubro de 2016, data do acidente. A empresa negou o vínculo, e defendeu-se afirmando que o garoto prestava serviços como "carrinheiro" do entreposto Ceagesp, onde sequer mantém comércio. Alegou também que “o único elemento de prova” nos autos, “hábil a estabelecer alguma relação entre si e o trabalhador”, encontra-se no depoimento de uma testemunha, outro garoto, amigo do falecido, que também trabalhava com ele. Esse empresário, porém, não negou que a vítima “tenha lhe prestado serviços esporádicos”, sem habitualidade, e reafirmou que “não é concessionário do entreposto, e que seu comércio fica a cerca de 400 metros de distância do Ceagesp”, para quem o garoto, segundo ele, “prestava serviços para tomadores diversos, como carregador de mercadorias comercializadas no entreposto”.
Já a Ceagesp, uma empresa pública federal, negou a responsabilidade solidária,  afirmando-se como “parte ilegítima para figurar no polo passivo da ação, na medida em que não se utilizou do trabalho prestado pelo menor”. Lembrou que suas atividades estão divididas em duas vertentes: a armazenagem e a entrepostagem e que, “em relação às atividades de entrepostagem, caso da Unidade de Sorocaba, apenas permite o uso remunerado de seus espaços a terceiros que visem a comercialização de produtos do agronegócio, administrando estes espaços, razão pela qual não figura como tomadora dos serviços de comercialização de mercadorias”.

Para a relatora do acórdão, a juíza convocada Márcia Cristina Sampaio Mendes, "não há dúvida de que havia exploração de trabalho infantil”, uma vez que no período do contrato, a idade do falecido (nascido em 22.8.2000) variou de 13 para 16 anos.  Por ocasião do primeiro julgamento, porém, “por conta da fragilidade das provas que foram apresentadas, não foi possível vislumbrar o vínculo de emprego entre o falecido e o primeiro réu”, afirmou a relatora. Mas com o depoimento da testemunha que declarou ter trabalhado na Ceagesp de 2013 a 2016, na banca de um produtor de flores, e antes, por cerca de ano, na “caixaria”, que fica do lado de fora da Ceagesp e que pertence ao empresário, foi possível assegurar que “o falecido trabalhou na ‘caixaria’ por cerca de três anos, todos os dias”. Em sua fala, revelou também que morava no mesmo bairro da vítima e, por segurança, “combinaram de irem juntos para o trabalho”, que era realizado nos mesmos dias e horários, “nas terças-feiras, quintas-feiras e sábados, das 7h00 às 17h00 e, nas segundas-feiras, quartas-feiras e sextas-feiras, das 3h00 às 13h00”.

Para o colegiado, partindo-se da premissa de que o falecido, com pessoalidade, prestou serviços não eventuais para o empresário, na função de ajudante geral, iniciando com 13 e encerrando com 16 anos, “período em que gozava do sistema de proteção do não trabalho (salvo na condição de aprendiz), os requisitos onerosidade e subordinação têm a importância relativizada”. Isso porque, “basta que tenha havido trabalho infantil e trabalho adolescente em continuidade daquele para se presumir a existência de subordinação jurídica, porque, à evidência, a criança e o adolescente não possuem completa formação cognitiva para se ativar autonomamente”. Da mesma forma, “pressupõe-se que o trabalho desenvolvido tenha sido remunerado, uma vez que o trabalho humano que não se enquadra na acepção de trabalho voluntário (Lei nº. 9.608/98) deve ser remunerado, sob pena de se configurar trabalho escravo”, afirmou o acórdão. Nesse sentido, condenou o empresário “a registrar no livro específico o vínculo de emprego ora reconhecido e anotá-lo na CTPS do autor”.

Já a Ceagesp não se limitou apenas a pedir a exclusão de sua responsabilidade solidária, mas também teceu “delongadas considerações” acerca da responsabilização da mãe “pela exploração do trabalho infantil de seu filho”. O colegiado respondeu à “impertinência da tese defensiva”, afirmando que não cabe  “a esta Especializada competência para julgar as causas relativas ao estado das pessoas e ao Direito de Família”, porém destacou o contexto social no qual sobreviviam mãe e filho, “ilustrado pelas anotações constantes da carteira de trabalho da reclamante, as quais informam que a mesma ativou-se durante toda sua vida útil precipuamente como empregada doméstica e contava com 55 anos por ocasião do falecimento do filho menor, tendo percebido como última remuneração mensal a quantia de R$ 820,00”.
Sobre o vínculo de emprego entre o trabalhador falecido e o primeiro reclamado, e a existência de responsabilidade da segunda empresa, principal motivo da ação, o colegiado afirmou que os fatos narrados “se deram comprovadamente dentro de suas instalações”. “As provas demonstram que o jovem prestava serviços de maneira contínua na ‘Caixaria’ da Ceagesp”, e embora ela alegue que o empresário não figure como um de seus permissionários/concessionários, e ainda que o estabelecimento dele não se localizasse dentro do entreposto, “fato é que a atividade laboral desenvolvida diariamente pelo menor (entrega/coleta de caixas e embalagens e eventuais serviços como carrinheiro a tomadores diversos), de fato, ocorria dentro do seu entreposto”, afirmou o acórdão.

Nesse sentido, para o colegiado, a Ceagesp “detinha a obrigação de fiscalizar e impedir o trabalho infantil realizado dentro de suas dependências, restando evidente que, ainda que de maneira indireta, beneficiou-se desse labor já que imprescindível que os produtos comercializados no entreposto fossem devidamente embalados e carregados”, e ainda salientou que não se admite “que a segunda reclamada não tenha tido ciência da existência de um trabalhador de parcos 13 anos, dada a formatação física de uma pessoa nesta fase de seu desenvolvimento psico-fisico”.

Por fim, sobre a obrigação de pagamento de indenização de R$ 100 mil, combatida pelas empresas com o argumento de que “não restou demonstrada a ilicitude da conduta”, nem que tenha existido “nexo de causalidade entre o dano experimentado com as funções desenvolvidas”, o acórdão rebateu elencando as diversas irregularidades praticadas, a começar da contratação de uma criança de 13 anos, o que implica por si só “dano moral pessoal e coletivo”, falta de registro, o que “impediu que a genitora dele e beneficiária direta perante a Previdência Social pudesse valer da pensão morte assegurada na legislação vigente (Lei nº. 8.213/91)”, a conduta negligente do empregador pela permissão do uso de motocicleta sem a devida habilitação, entre outros. Assim, o colegiado reputou que o montante arbitrado pelo Jeia de Sorocaba “importa em valor justo e compatível com a gravidade do sinistro ocorrido, considerando-se, ainda, o aporte da reclamada e o caráter pedagógico da sanção a fim de se evitar procedimentos semelhantes no futuro por parte dos reclamados”. (PROCESSO 0011653-91.2018.5.15.0109)

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