Reflexões sobre tecnologia e dignidade marcam conferência sobre o futuro do direito do trabalho
A conferência sobre “O Direito do Trabalho no Século 21” abriu, nesta sexta-feira (15/8), o segundo e último dia do 25º Congresso do TRT-15, propondo uma reflexão sobre os rumos da proteção social em um cenário de rápidas transformações tecnológicas. A convidada palestrante foi a ministra do Tribunal Superior do Trabalho e diretora da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho, Kátia Magalhães Arruda, com apresentação da desembargadora presidente do TRT-15 no Biênio 2020/2022, Ana Amarylis Vivacqua de Oliveira Gulla.
#ParaTodosVerem: desembargadora Ana Amarylis está falando ao microfone, no púlpito.
Ao apresentar a conferencista, a desembargadora afirmou que o direito do trabalho é “um organismo vivo que pulsa no ritmo da sociedade e se transforma junto com ela” e que a Justiça do Trabalho, com mais de 80 anos de história, representa “uma missão de resistência, escuta e compromisso com o ser humano”. Em um tom pessoal, lembrou sua própria trajetória, dizendo que encontrou nesse ramo da Justiça “não apenas a vocação, mas um propósito de vida, porque é um espaço onde é possível igualar os desiguais e promover justiça social com humanidade”.
Quem se beneficia das mudanças tecnológicas?
#ParaTodosVerem: ministra Kátia Arruda está falando ao microfone, no púlpito.
Em sua exposição, a ministra Kátia Arruda destacou que o desafio contemporâneo não é apenas reagir às mudanças, mas propor caminhos para um direito do trabalho conectado aos princípios constitucionais, aos compromissos internacionais e à centralidade da dignidade humana. Ela iniciou propondo três questões como fio condutor: se as mudanças tecnológicas têm realmente beneficiado trabalhadores e trabalhadoras, quais são os obstáculos e contradições que o direito do trabalho enfrenta, e como fortalecer a jurisprudência trabalhista para garantir direitos às futuras gerações. Ao tratar da primeira questão, citou pesquisa que revela que 83% dos jovens brasileiros têm acesso à internet, mas três quartos deles pertencem a famílias de origem humilde e dependem apenas de celulares para estudo e trabalho. E fez um alerta: “A tecnologia tem beneficiado quem e para que objetivos? Precisamos manter o pensamento crítico e evitar o fetichismo tecnológico que ignora seus efeitos sobre o trabalhador”.
A ministra apontou que, apesar das promessas de liberdade e flexibilidade, a tecnologia frequentemente aprofunda o controle e a precarização, atingindo de forma mais severa mulheres, jovens e trabalhadores mais velhos. Ao citar a Convenção 156 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata da inserção de pessoas com responsabilidades familiares, defendeu que a sociedade brasileira precisa se mobilizar para assegurar políticas que equilibrem vida profissional e cuidados domésticos: “O trabalho decente é incompatível com a miséria e a privação, e deve ser visto como a mais importante política pública para promover desenvolvimento e reduzir desigualdades”.
#ParaTodosVerem: foto do público no Expo Dom Pedro, com a ministra Kátia de pé, no púlpito, falando ao microfone.
Sobre os obstáculos e contradições, Kátia observou que o Brasil vive uma “banalização da desvalorização do trabalho”, o que impede avanços e concentra esforços apenas na defesa de direitos já existentes. Recorreu ao pensamento de autores como Robert Castel para explicar que a precarização não atinge apenas trabalhadores vulneráveis, mas também aqueles antes considerados estáveis, gerando insegurança social e exclusão. “O que vemos é a construção de uma sociedade de desesperançados, em que muitos não encontram mais um lugar na estrutura social e perdem o sentido de pertencimento”, disse.
Na parte final, defendeu maior integração entre normas internacionais e jurisprudência nacional, citando casos da Corte Interamericana de Direitos Humanos que envolvem trabalho escravo, discriminação e segurança no trabalho. Ressaltou a necessidade de fortalecer a negociação coletiva, combater práticas discriminatórias e exigir cláusulas sociais em contratos internacionais. Ao concluir, destacou que “o direito do trabalho não pode ser apenas reativo, precisa ser propositivo e fiel ao ideal social da Constituição”, acrescentando que a educação e a conscientização são fundamentais para que “amemos o mundo o suficiente para assumir responsabilidade sobre ele”.
#ParaTodosVerem: ministra Kátia posa para foto ao lado da presidente, desembargadora Ana Paula Lockmann, e a desembargadora aposentada e ex-presidente do TRT-15, Eliana Felippe Toledo.
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